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Junto com a pandemia do coronavírus tem uma ‘doença’ que dói tanto quanto os sintomas da Covid-19: o preconceito. As pessoas além de conviver com os sintomas, com o medo dos efeitos desse novo vírus, que ainda não tem uma medicação cem por cento eficaz e nem uma vacina, têm que conviver com o preconceito, mesmo depois de curado.  

 

 A vendedora Alessandra Pereira, foi testada positivo, cumpriu a quarentena e viveu os desafios que a doença apresenta: o isolamento domiciliar, o distanciamento das pessoas que ama, e depois de curada, pensou que poderia voltar à normalidade se deparou com o preconceito. Ela conta ser uma situação chata e constrangedora, mas tenta seguir a vida. Ela que trabalha com vendas relata que já teve situações em que o cliente falou que não gostaria de ser atendida por ela. A reação foi deixar uma colega de trabalho atender a pessoa. Conta também que há poucos dias foi à casa de um conhecido levar uma encomenda e a pessoa sequer abriu o portão para ela entrar, uma situação que nunca havia ocorrido. Para ela, a pessoa quis manter a distância por medo, mesmo ela estando curada. “É uma situação muito constrangedora e que me deixa triste, mas sigo firme”, comenta.

 

O caminhoneiro Leandro Rodrigues conta que sofreu forte preconceito. Ele fez o teste em São Paulo e quando saiu o resultado, os próprios colegas de trabalho já começaram a agir diferente com ele. Para ele, foi uma situação constrangedora, pois além do resultado, o testado positivo tem que conviver com o medo das outras pessoas. Ele relata que os familiares também agiram diferente com ele. “Eu me decepcionei com muitas pessoas. Tinha pessoas que pensei que não agiria com preconceito, mas tiveram”. Ele ainda relata que devido à sua profissão a situação agravou mais ainda. Segundo ele, até para fazer uma refeição nos locais às margens das estradas é difícil.

 

Com a jovem Jessica Leal, também não foi diferente. Ela, mesmo depois de curada, encontrou dificuldades para coisas simples, como encontrar uma manicure. Ela que teve toda a família infectada, diz que eles também sentiram olhares diferentes e conviveram com situações constrangedoras. Relata que teve familiares que foram denunciados por serem visto em supermercados mesmo após o fim da quarentena e estarem curados.

 

A psicóloga do Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF) da Secretaria Municipal de Saúde de Gurupi, Ana Paula Antunes, especialista em psicologia da saúde e hospitalar, comenta que a pandemia do novo coronavírus desencadeou uma onda de preconceito contra as pessoas que testaram positivo para covid-19. Relata que até mesmo profissionais da saúde sofrem discriminação por estarem à frente no combate à doença e são vistos como potenciais transmissores do vírus.

 

Segundo ela, o preconceito, qualquer que seja, leva a um comportamento segregativo complicadíssimo.  “Diante do vírus temos que conscientizar as pessoas que ele não escolhe classes sociais, sexo e etnias, então atribuir o vírus a um determinado grupo é um exagero e o preconceito traz inúmeras consequências à saúde mental que podem resultar em crises de ansiedade, excesso de preocupação, tristeza, angústias, incertezas e um medo constante”, destaca.  

 

Ana Paula enfatiza que nesse momento as pessoas precisam ser acolhidas.  “Imagine a cabeça da pessoa que foi testada positivo, com o medo do que o vírus pode causar e se a gente discrimina a colocamos em um sofrimento emocional bem pior. Nós psicólogos recomendamos sempre o diálogo  para que a pessoa possa externalizar o que está sentindo. O momento exige distanciamento, mas esse diálogo pode ser por telefone, aplicativos de mensagens e a pessoa também pode procurar a ajuda de um profissional”, pontua.

 

A psicóloga explana que em momentos de crise as pessoas tendem a ter dois comportamentos  opostos: o de solidariedade muita intensa, ou de um egoísmo que leva à segregação. É como se distribuíssem ódio após a notícia.  Ela comenta também que a forma com as informações sobre prevenção, transmissão da doença não são absorvidas por todos da mesma maneira e isso explica os variados tipos de reações.  “Essa absorção das informações ocorre de forma muito individual, dependendo muitas vezes dos valores, crenças e abertura para o novo e esses fatores determinam como cada um vai reagir à situação”, enfatiza.

 

A secretaria de Saúde de Gurupi conta com psicólogos no Núcleo de Apoio à Saúde da Família – Atenção Básica, que podem prestar  apoio às pessoas que estão enfrentando a doença e o preconceito.  O coordenador do NASF-AB, Lucas França, explica que o agendamento para os atendimentos psicológicos é feito por meio de encaminhamento da Vigilância Epidemiológica ou do médico do território à coordenação da equipe NASF-AB e a partir daí é encaminhado às psicólogas. O  atendimento psicológico é feito via tele-consulta ou via aplicativo em horário de funcionamento das Unidades  Básicas de Saúde. Lucas enfatiza que esse tipo de atendimento é permitido pelo Conselho de Psicologia.

 

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